Ao chegar a Portugal levando apenas as malas de mão, sem ter quem os receba, são encaminhados a um hotel do Instituto de Apoio ao Retorno dos Nacionais, onde experimentam o estigma que se abate sobre os retornados — que vivenciam o oposto ao "avanço" colonial —, sobretudo aqueles que, como a família desta história, não pertenciam à classe privilegiada dos administradores da colônia.
Narrado por Rui, o filho adolescente já nascido em Angola (e para quem a metrópole era uma ideia abstrata), o romance aborda de maneira sensível um dos episódios mais sombrios da história portuguesa: o retorno para Portugal de mais de meio milhão de pessoas, trabalhadores vindos sobretudo de Angola e Moçambique. O narrador se vê às voltas com um mundo cheio de racismo e violência, com questões como culpa e vergonha, direitos e identidade despontando, à medida que amadurece e se desilude com a vida na metrópole e com a situação da sua e de tantas outras famílias.
Uma das ficcionistas mais importantes da literatura portuguesa contemporânea, Dulce Maria Cardoso trata, neste O retorno, de um trauma coletivo a partir da própria história, transformando a memória daqueles dias conturbados numa ficção única sobre o desterro e a capacidade humana de recomeçar.
Dulce Maria Cardoso é portuguesa de Trás-os-Montes. Nascida em 1964, viveu em Angola dos seis meses de idade até o princípio da guerra civil, deflagrada após a independência do país. Com uma obra que já soma cinco romances, dois livros de contos e uma autobiografia, a autora vem acumulando prêmios desde o lançamento de seu primeiro livro, em 2001. Dela, a Todavia publica Eliete: A vida normal (2021).