A guerra e a peste, flagelos congénitos do homem, ou gerados pelo homem na peçonha do pecado, como dizem bons teólogos e doutos moralistas, devastavam Lisboa em 1833.
Cruzavam-se às dezenas as macas, umas internando os feridos das baterias: estes, por entre os cortinados de lona, deixavam ver o rosto arregoado de sangue ou cortado de golpes. Outras macas levavam os mortos de contagião aos valados dos cemitérios, onde os cadáveres a monte exalavam vaporações pestilenciais.
O troar da artilharia e o dobre a finados, estridor medonho com que falava o rancor humano, e plangente pedir de orações para as almas dos extintos, casavam-se em lúgubre toada; porém, o sentir íntimo daquelas duas manifestações – uma, ódio de guerra, outra, piedade de sufrágio –, repeliam-se, eram o antagonismo da crença e da religião, da civilização e da barbaria, a antinomia do céu e do inferno.