Mais importante obra de Angela Davis, "Mulheres, raça e classe" traça um poderoso panorama histÃģrico e crÃtico das imbricaçÃĩes entre a luta anticapitalista, a luta feminista, a luta antirracista e a luta antiescravagista, passando pelos dilemas contemporÃĒneos da mulher. O livro ÃĐ considerado um clÃĄssico sobre a interseccionalidade de gÊnero, raça e classe. A perspectiva adotada por Davis realça o mÃĐrito do livro: desloca olhares viciados sobre o tema em tela e atribui centralidade ao papel das mulheres negras na luta contra as exploraçÃĩes que se perpetuam no presente, reelaborando-se. O reexame operado pela escrita dessa ativista mundialmente conhecida ÃĐ indispensÃĄvel para a compreensÃĢo da realidade do nosso paÃs, pois reforça a prÃĄxis do feminismo negro brasileiro, segundo o qual a inobservÃĒncia do lugar das mulheres negras nas ideias e projetos que pensaram e pensam o Brasil vem adiando diagnÃģsticos mais precisos sobre desigualdade, discriminaçÃĢo, pobreza, entre outras variÃĄveis. Grande parte da nossa tradiçÃĢo teÃģrica e polÃtica (Gilberto Freyre e SÃĐrgio Buarque de Holanda, para ficarmos em poucos exemplos) insiste em confinar as questÃĩes aqui tratadas por Davis na esfera privada, como se apenas desta proviesse sua soluçÃĢo. A iniciativa da Boitempo de traduzir esta obra, ainda nÃĢo publicada no Brasil, desponta como uma inestimÃĄvel contribuiçÃĢo para disseminar as ideias imprescindÃveis de Angela Davis (sabemos o quanto ela vem sendo estudada e difundida pelo feminismo negro e por setores da academia) e oferecer, assim, angulaçÃĩes e perspectivas pouco ou nada exploradas pelos empreendimentos voltados à compreensÃĢo da nossa intrincada realidade. Como aconselha Bobbio, para nÃĢo sermos induzidos a crer que a histÃģria, a cada ciclo, recomeça do zero, ÃĐ preciso ter paciÊncia e saber escutar as liçÃĩes dos clÃĄssicos. Em tempos sombrios, esse conselho soa como urgÊncia polÃtica.