Relações Internacionais: Temas Contemporâneos

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O campo científico de Relações Internacionais começou a ser construído depois da Grande Guerra, num contexto de expansão da perspectiva liberal impulsionada pela vitória da Tríplice Entente no conflito e pela articulação criada pelo então presidente norte-americano, Woodrow Wilson, para a criação da Liga das Nações. Ocorre que, entre a década de 1920 e o fim da Guerra Fria, em dezembro de 1991, a agenda do cenário internacional foi majoritariamente dominada pela dualidade entre guerra e paz, que mobilizou não apenas os recursos financeiros das grandes potências, mas também os esforços intelectuais necessários para compreender os impactos de todos os confrontos do século XX para as RIs.

A década de 1990 viu não apenas o surgimento de uma suposta nova ordem internacional, mas também a ampliação do leque de temas que passavam a receber mais atenção dos países no âmbito global: diante das mudanças causadas pelo encerramento das hostilidades entre Estados Unidos e União Soviética, houve espaço para as nações adotarem novas estratégias de política externa para aumentar sua presença nos fóruns multilaterais. Logo, discussões até então relegadas à periferia das Relações Internacionais - mas que, pragmaticamente falando, já eram relevantes -, assumiram uma importância maior nas discussões internas às Nações Unidas e mesmo para as relações bilaterais entre os países neste momento de virada epistemológica da disciplina de RI.

Diante dessa mudança, temáticas relativas ao meio ambiente e energia, por exemplo, tornaram-se centrais para os Estados. Consequentemente, também assumiram uma posição de destaque para a formação dos internacionalistas, principalmente porque estão relacionados às novas perspectivas de governança global. Tratam-se de duas discussões que não afetam apenas os governos e o poder público, mas também as empresas multinacionais, que precisam compreender melhor seu processo de inserção internacional diante do novo quadro de abertura neoliberal e do próprio adensamento do processo de globalização: isso significa que temáticas associadas à guerra e à paz passaram a ser relativizadas dentro da nova realidade, e as discussões periféricas passaram por uma elevação de status, inclusive pelo seu peso nos negócios estrangeiros.

É possível verificar que o contexto pós-Guerra Fria afetou sensivelmente a área de Relações Internacionais a ponto de permitir não apenas a inserção de novos temas na agenda, mas também a ressignificação de debates mais tradicionais, como aqueles envolvidos com o campo de segurança. Esse cenário renovado, que é marcado pela ascensão das guerras de quarta geração, ou seja, os confrontos intraestatais, tem gerado duas discussões distintas: primeiramente, o Estado deixa de ser o protagonista dos conflitos, o que remete à reflexão sobre o lugar dos indivíduos na guerra e à construção do conceito teórico de segurança humana; em segundo lugar, devemos assumir que os confrontos também se transformaram diante das novas tecnologias, e, com isso, incorporaram elementos cada vez mais relevantes para o cenário global - levando, assim, às ponderações sobre segurança cibernética..

Além desses temas consideravelmente recentes para as Relações Internacionais, a dissolução da União Soviética e o encerramento da Guerra Fria também impulsionaram os processos de integração regional, que se tornaram mais profundos e densos. É a prova de que a globalização e a regionalização são fenômenos que demandam cada vez mais a atenção dos especialistas e a articulação de conhecimentos interdisciplinares para serem adequadamente analisados. Podemos utilizar dois exemplos para sustentar essa afirmação: foi na década de 1990 que vimos a criação do Mercosul e a união da zona do euro; como contra-exemplo, para demonstrar a complexidade desse assunto, vimos a população do Reino Unido aprovar o Brexit, ou seja, a retirada do país do bloco regional, ao passo em que a Turquia vinha intensificando seu interesse em integrar o grupo.

Esse plano internacional renovado demanda que o estudante de Relações Internacionais receba uma formação interdisciplinar, como forma de se preparar para um mercado de trabalho mais dinâmico - tanto para quem pretende atuar no campo diplomático quanto para aqueles que vão trabalhar em empresas transnacionais. Inclusive, é interessante verificar o quanto o crescimento da área no Brasil está associado ao fim da Guerra Fria: trata-se do período em que a abertura do mercado brasileiro ao exterior passou a exigir profissionais mais capacitados para entender os dilemas do processo de internacionalização e a relevância do setor de relações governamentais para o cumprimento de seus objetivos - o que culminou no aumento do número de bacharelados e matrículas no país.

Partindo dessas premissas, esse livro foi organizado para contribuir com a formação dos internacionalistas nas universidades brasileiras. Os sete capítulos que compõem essa obra discutem temáticas contemporâneas para o campo científico de Relações Internacionais e para o mercado de trabalho, e envolvem pontos cruciais para o atual estágio do desenvolvimento do sistema internacional. O projeto foi elaborado de modo a oferecer ao leitor um conjunto de textos escritos por especialista em cada área, de forma didática e com linguagem acessível. É importante ressaltarmos, contudo, que os capítulos possuem graus de complexidade distintos, em decorrência da divergência de densidade dos temas expostos. 

O livro, além disso, foi pensado para que os capítulos estivessem padronizados: todos possuem, além do texto principal, uma série de elementos visuais, tais como gráficos e tabelas, e um glossário com as palavras-chave centrais. Dois detalhes finais: a proposta da obra não é esgotar o debate sobre esses temas, mas sim fomentar algumas das discussões contemporâneas mais elementares para entendermos o campo de Relações Internacionais; por fim, os textos apresentados neste volume não dispensam a leitura das obras clássicas, que são fundamentais para a boa preparação do internacionalista.

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