Tendo como base o conceito do filósofo camaronês Achile Mbembe de necropolítica, Franco recupera nas guerras coloniais os mecanismos de contrainsurreição que foram legados aos generais das ditaduras latinoamericanas e fizeram do desaparecimento um método de repressão. Mas esse não é um fenômeno de "exceção" durante a ditadura, ao contrário, como mostra Franco, ele está entranhado na estrutura governamental do Brasil, presente nas mais diversas estratégias que tornam o desaparecimento um modo de governar. Não é preciso que o Estado mate; basta que ele deixe morrer ou deixe matar. Ou ainda: que deixe que se matem uns aos outros. Não é preciso que o Estado suma com os corpos; é suficiente que não procure os desaparecidos nem quem os fez desaparecer. O mesmo se estende às mortes por epidemias, ignoradas ou camufladas pelos poderes públicos.
No momento em que o Brasil está entre os líderes de vítimas da covid-19 no mundo e ocorre uma banalização dessas mortes, uma política sistemática de dessensibilização do corpo social, o livro de Franco é ferramenta valiosa para a compreensão dos mecanismos da necropolítica que nos trouxeram até aqui.